segunda-feira, 19 de março de 2007

Do deslumbre ao desespero

6° dia

Acordamos às seis e meia depois de uma noite de sono revigorante ...e quentinha! Café-da-manhã expresso e pé na estrada de novo. Primeria parada: San Juan del Rosario, um vilarejo perdido no meio do deserto. Casinhas, praça, igreja, escola. E uma vendinha que vendia chocolates do século passado. Mas, que se dane data de validade. Aproveitamos pra refazer nosso estoque de guloseimas, já que essa seria a última parada em lugar "habitável" até o fim do dia.

Ficamos sabendo mais tarde que por ali existe um cemitério que abriga incríveis múmias, mas parece que bateu uma certa preguiça no Matteo em mostrar pra gente. Seguimos caminho para conhecer as lagoas. No caminho, lhamas e alpacas ao som de Alaska, a banda preferida do Matteo. Bom, se é ou não, o fato é que era a única fita que havia no carro pra alimentar nosso toca-fita. A Bella bem que tentou emplacar Placebo, mas acho que não durou nem uma música ao ouvidos rigorosos de Matteo. Bella apelou pro volume máximo do disk-man, enquanto o resto se esforçava pra decorar as letras estranhas que tocavam no alto-falante. Vamos lá, todo mundo: "chica vem me alissssssar!!"

Depois de muito chão e muita poeira, chegamos à primeira lagoa. Não sabia que existia lugar assim no mundo. Sempre achei que as fotos dos panfletos se valiam de algum filtro fotográfico, de um ângulo favorável, do talento do fotógrafo. Mas o fato é que eu estava vendo com os meus próprios olhos um dos lugares mais incríveis do mundo. E aos meus olhos, ele era dez vezes mais bonito do que nas fotos.

E foi nesse cenário que fizemos nosso segundo almoço. Cardápio: Sanduíche de queijo, tomate, pepino e um pouco de poeira, porque ventava demais por lá. Dessa vez, um achocolatado ajudou a saciar um pouco mais meu estômago exigente. Antes de partir, mais algumas fotos, um xixi rápido ao vento e com vista para os flamingos, e um agradecimento de todo coração por estar naquele lugar. Mal sabia eu o que ainda estava por vir.

Alguns enguiços depois, chegamos a outra lagoa. E posso dizer que, se Deus realmente existe, era lá que Ele estava. Uma lagoa azul piscina aos pés de uma montanha nevada, povoada por felizardos flamingos e cercada de turistas boquiabertos. Nós quatro ficamos em silêncio por uns bons minutos. Peguei minha filmadora pra registrar o lugar, mas não conseguia um take sequer que fizesse jus ao lugar. Tentei captar depoimentos das minhas companheiras de viagem, mas só levei fora. É, tenho que concordar que não há muito o que dizer sobre um lugar como esse. E estando lá, o melhor mesmo é ficar em silêncio. Desculpem por interromper. De verdade.

A única coisa que atrapalhava nosso dia era o chá de cadeira no carro para ir de um lugar ao outro, mas que se importava com aquilo, se a cada parada o que já era bom ficava ainda melhor? Ao fim do dia, chegamos à Árbol de Piedra, um dos cartões postais do deserto. Além da árvore de pedra propriamente dita, outras rochas enormes surgiam em pleno deserto, formando uma paisagem um tanto quanto surreal. Não ficamos muito, pois já começava a esfriar e o vento estava fortíssimo. Sem contar a poeira, que àquela altura já tinha sido incorporada a cada orifício do meu ser.

A Laguna Colorada foi nossa próxima e última parada do dia. Passaríamos a noite ali num abrigo para turistas. Essa noite especificamente, todo os turistas dormiriam no mesmo lugar, pois ali não há nenhuma outra opção de hospedagem. Estamos mesmo no meio do deserto. Chegando ao alojamento, escolhemos nosso quarto, um dos poucos ainda desocupados. Lá dentro apenas seis camas de mola, onde dormiríamos nós quatro e o casal de italianos. Algumas janelas estavam quebradas, então fazia um frio de lascar mesmo dentro do quarto. Largamos as coisas por lá, e como ainda era dia lá fora, fomos dar uma andada pra ver a lagoa. O vento era ainda maior e as poças congeladas pelo caminho me diziam que era melhor voltar pro alojamento. Mas a beleza da lagoa nos levava pra cada vez mais longe de lá, e quando o sol finalmente se pôs e o frio chegou com força total, estávamos há uma distância considerável do nosso abrigo. A volta durou uma eternidade. Minhas mãos congelavam, minha boca começava a rachar, meu nariz a escorrer, e meus dedos a cair. Ok, não chegaram a cair, mas se tivessem caído eu certamente não sentiria!

Naquela noite, o banho sequer foi assunto na mesa de jantar. Ninguém teve coragem de levantar o tema, então todos dormimos cheios de poeira e sem nenhuma vergonha. Antes disso, o jantar. Primeiramente, sopa de quínua. Estava tão quentinha que eu comeria umas dez se pudesse, mas pra nossa felicidade, o Matteo trouxe o prato principal: macarronada! Até mesmo o Pierre gostou da idéia! Mais tarde o Diego também se juntou a nós, e ficamos tomando chá (eu nunca tomei tanto chá na minha vida, só aquilo me esquentava!) até que, às dez em ponto, todas as luzes se apagaram em fomos obrigados a dormir.

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